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O acórdão da Relação que arrasa a acusação contra Sócrates

Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa determinaram o fim do segredo de justiça interno. A defesa de José Sócrates vai poder analisar os indícios. Mas o acórdão que sustenta esta decisão (não passível de recurso) é uma ‘machadada’ na acusação.

Os juízes desembargadores Rui Rangel e Francisco Caramelo decidiram, por unanimidade, pôr termo ao segredo de justiça interno, que impedia a defesa de ter acesso aos indícios que recaem sobre José Sócrates.

A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa não é passível de recurso e, em breve, a defesa do ex-primeiro-ministro e dos restantes suspeitos terá acesso a toda a informação da ‘Operação Marquês’.

O acórdão que sustenta a decisão daqueles juízes arrasa a acusação. “Pena que entre nós não exista a cultura de que uma acusação será mais forte e robusta e, sobretudo mais confiante, consoante se dê uma completa e verdadeira possibilidade ao arguido de se defender”, realçam os juízes .

Mas Rui Rangel e Francisco Caramelo vão mais longe. E falam em “truques” e “ estratégia dos investigadores”, ao adotarem o segredo de justiça interno.

Recorde-se que os advogados de Sócrates sempre criticaram o facto de a defesa do ex-primeiro-ministro não ter acesso aos indícios que sustentavam esta acusação.

“O conhecimento cabal dos factos e das provas que lhe são imputados em sede de investigação, não fazendo com que o segredo de justiça sirva de arma de arremesso ao serviço da ignorância e do desconhecido”, salientam ainda os desembargadores, neste acórdão.

E se o primeiro acórdão da Relação (que confirmara a prisão preventiva de Sócrates, em março, recorreu a um provérbio popular  (“quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vêm”, o acórdão de Rui Rangel e Francisco Caramelo cita o padre António Vieira: “Quem levanta muita caça e não segue nenhuma, não é muito que se recolha de mãos vazias.”.

Esta não a primeira vez que um juiz se pronuncia de forma dura para a acusação. O juiz que votou a favor do recurso apresentado recentemente pela defesa de José Sócrates, salientou que o Ministério Público “não descreve um único indício factual” que justifique a prisão preventiva do ex-governante. “Não há complexidade alguma em investigar o nada”, reforçou.

Vencido, mas não convencido, José Reis, o juiz desembargador que votou de vencido, fez várias críticas à atuação do Ministério Público, vertidas no projeto de acórdão, citado pela TSF.

“Não se pode justificar a excecional complexidade com a indicação, de forma desgarrada e difusa, de uma enxurrada de factos (alguns de muito duvidosa relevância criminal) e a omissão de outros que são nucleares para permitirem estabelecer indiciariamente uma conexão aos primeiros”, argumentara José Reis.

O juiz sustentou que, tal como alegara a defesa do ex-primeiro-ministro, “não existe matéria indiciária bastante” para que a investigação seja classificada como de especial complexidade, pelo que também “não podem ser elevados os prazos de duração do inquérito, do segredo de justiça, nem de prisão preventiva”.

“Não se pode fazer um juízo fundamentado acerca da complexidade da investigação, sendo certo que não há complexidade alguma em investigar o nada, o vazio”, explicou então o magistrado, que também adiantou que o Tribunal da Relação de Lisboa “fica sem saber o que, concretamente, com relevância criminal, se está a investigar”.

Ainda segundo o projeto de acórdão, citado pela rádio, o juiz desembargador frisou que o processo “parte da presunção de ocultação de fundos financeiros e transferências”, mas depois apresenta “contornos difusos e desmasiado genéricos”, pelo que “não é possível surpreender qualquer conexão objetiva entre a circulação daqueles fundos e os alegados e imputados crimes”.

“Continua a faltar descrição indiciária objetiva do cimento da ligação”, resumiu José Reis.

Segundo o magistrado, o trabalho do MP é “manifestamente incompleto dada a total ausência de descrição de indícios factuais” sobre o alegado crime de corrupção, tanto mais que José Sócrates só foi confrontado com factos que configuram o crime de branqueamento de capitais: “Esta é a realidade nua e crua”.

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