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MP são-tomense ordena arquivamento de processos que envolvem ex-governantes

O Ministério Público de São Tomé e Príncipe ordenou o arquivamento, por “inexistência de indícios criminais”, de dois processos que envolviam o ex-ministro das Finanças Américo Ramos, em prisão preventiva desde abril, e o antigo primeiro-ministro Patrice Trovoada.

Em causa estão o empréstimo de 30 milhões de dólares (26,6 milhões de euros) do China International Fund, e o empréstimo de 17 milhões de dólares (15 milhões de euros) do Fundo do Kuwait, para a requalificação do Hospital Ayres de Menezes, na capital são-tomense, ambos acordados durante o Governo liderado por Patrice Trovoada (2014-2018).

“A instrução preparatória iniciou-se em 2017 e foram investigados os factos que indiciavam abstratamente a prática de crimes de corrupção, peculato, participação económica em negócio e abuso de poderes”, segundo um comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR) são-tomense.

Em ambos os processos, o Ministério Público (MP) são-tomense considerou não existirem indícios suficientes, pelo que determinou o seu arquivamento.

“O Ministério Público considerou que atenta as provas documentais e testemunhais recolhidas nos autos não se encontravam suficientemente indiciados os crimes de corrupção, peculato, participação económica em negócio. Por isso, considerando a não suficiência de indícios foi ordenado (…) o arquivamento dos autos”, afirma a PGR.

“Atento o despacho de arquivamento (…), a medida de coação aplicada ao arguido [Américo Ramos] extinguiu-se, pelo que deve o mesmo, de imediato, ser colocado em liberdade. Comunique-se, pelo meio mais expedito, ao estabelecimento prisional”, lê-se no despacho, assinado pela procuradora Celma Castelo David, a que a Lusa teve acesso.

Américo Ramos, antigo ministro das Finanças do executivo de Patrice Trovoada e atualmente assessor do Presidente são-tomense, Evaristo Carvalho, foi detido pela Polícia Judiciária (PJ) no início de abril, sem mandato do MP para tal, após denúncias do Governo liderado por Jorge Bom Jesus sobre estes dois casos.

No âmbito das averiguações, que contaram com o apoio das autoridades portuguesas, foram ouvidas seis testemunhas, nomeadamente de representantes de instituições públicas como a Direção do Tesouro, Banco Central, Gabinete de Seguimento da Dívida Publica, e Direção de Planeamento e Estudos do Ministério das Infraestruturas.

Quanto ao empréstimo do China International Fund, “detido pelo empresário chinês conhecido por Sam Pa”, as investigações permitiram confirmar que 10 milhões de dólares (8,8 milhões de euros) deram entrada numa conta, na Caixa Geral de Depósitos em Portugal, do Banco Central de São Tomé e Príncipe, no dia 29 de julho de 2015, e que essa tranche “foi sendo sucessivamente transferida das contas do Tesouro Público para pagamento das despesas de investimento do Estado” são-tomense.

“Não se descortina se os restantes 20 milhões chegaram a ser desembolsados, e a quem, embora se possa inferir que assim não ocorreu, uma vez que o empresário que detinha o fundo foi detido [em outubro de 2015] e não existe qualquer evidência de aquele dinheiro ter alguma vez entrado em contas bancárias do Estado de São Tomé e Príncipe ou dos suspeito [Patrice Trovoada] e arguido [Américo Ramos]”, refere o despacho.

Além disso, o próprio Américo Ramos e já o atual Governo, através do ministro das Finanças, Osvaldo Vaz, fizeram diligências para que a verba restante fosse entregue ao país.

“Não resulta suficientemente indiciado que o arguido Américo Ramos e o suspeito Patrice Emery Trovoada, enquanto ministro das Finanças e primeiro-ministro, aquando da celebração do acordo de crédito com a China International Fund, receberam qualquer valor dos 30 milhões de dólares, (…) e que os tenham feito seus, agindo como se aqueles lhes pertencessem”, acrescenta a decisão do MP.

Quanto ao empréstimo de 17 milhões de dólares, a procuradora refere que o contrato celebrado entre o Estado são-tomense e o Fundo do Kuwait “acautelou todos os requisitos exigidos pelo Fundo Monetário Internacional”, foi aprovado pela Assembleia Nacional e ratificado pelo Presidente da República.

No âmbito deste processo, que previa a requalificação do edifício do hospital da capital são-tomense e a construção de um novo edifício, foi lançado concurso público internacional e, em março de 2017, foi selecionada uma empresa para fazer o projeto, no valor de quase 1,4 milhões de dólares (1,2 milhões de euros). Caberia ao Estado são-tomense pagar ao Kuwait um reembolso, de 209 mil euros, correspondentes a 15 por cento do contrato, aquando da sua assinatura.

Neste caso, em que também é suspeito o antigo ministro das Obras Públicas Carlos Vila Nova, “não existem provas de que os suspeitos e o arguido hajam beneficiado de qualquer montante disponibilizado pelo Fundo do Kuwait”, além de que os juros associados “são amplamente benéficos quando comparados com os vigentes no mercado das dívidas públicas”.

No despacho, o Ministério Público determina uma averiguação autónoma para “apurar a eventual responsabilidade” de Carlos Vila Nova, constituído arguido, enquanto ministro das Obras Públicas, por terem sido registados, em 2016, com caráter urgente, dois catamarãs a favor do Ministério da Defesa, “com dados em falta”, e que tinham sido oferecidos pelo China International Fund.

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