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“Estado falhou no dever de prevenir e combater a corrupção”, diz Maria José Morgado

A procuradora-geral adjunta Maria José Morgado defendeu que Portugal tem de reconhecer que “o Estado falhou no seu dever de detetar, prevenir e combater a corrupção”.

Em entrevista à TVI, a procuradora, com mais de quatro décadas de serviço no Ministério Público, salientou que está “há 20 anos” a apelar a uma “abordagem ponderada” à corrupção, fenómeno que em Portugal continua a ter, segundo ela, uma “abordagem sensacionalista”.

“Se Portugal é um país corrupto ou não? Não tem resposta. Se a corrupção atingiu níveis de risco elevados e atravessou setores da atividade política, económica, pública, privada, administrativa, judicial, etc, reconhecidamente agora, ao fim de 20 anos, se reconhece que o Estado falhou no seu dever de detetar, prevenir e combater a corrupção e nós temos de funcionar”, esclareceu Maria José Morgado.

Admitindo que “os níveis e os riscos de corrupção são elevados” em Portugal, a procuradora-geral adjunta salientou que “não há nenhum estudo fiável sobre o grau e o nível de penetração de corrupção nas estruturas do Estado”.

Os próprios critérios da Transparência Internacional, uma entidade “muito responsável”, variam “de país para país”, não permitindo responder “quais são os riscos de corrupção em Portugal”, nem porque “não há planos de gestão de risco”.

Maria José Morgado lamentou ainda que, na justiça portuguesa, “tudo” seja “atirado para os tribunais, para as polícias, para o Ministério Público, para os juízes”, tanto mais que os casos, nesse momento, encontram-se “já numa fase muito avançada”.

“Continuamos nos cuidados intensivos”, alertou a procuradora, deixando questões em aberto para reflexão: “Porque é que a prevenção não funciona? Porque é que não agimos de forma a prevenir os contextos que criam um plano inclinado que leva à corrupção?”.

A corrupção “é um fenómeno abrangente” e tem de ser tratada “de forma integrada e ponderada”, insistiu.

“A corrupção é como o pó nas nossas casas. Se não limparmos todos os dias, temos sempre pó. O pior que se pode fazer é a abordagem mediatico-sensacionalista porque entramos numa bola incandescente”, considerou ainda a procuradora-geral adjunta.

“O pior que pode acontecer”, para o Ministério Público, são os “julgamentos na praça pública”, dado que prejudicam a produção da prova a equidade do julgamento.

“A última coisa que o Ministério Público quer é este tipo de espectáculo”, garantiu Maria José Morgado.

Nos crimes económicos, a prova é mais difícil de produzir, tanto mais que em Portugal não se aplica a delação premiada.

“Não temos a faca com sangue, não temos a pistola fumegante, normalmente não temos confissões, nem testemunhas”, realçou.

Pessoalmente, a procuradora é “a favor” das sentenças negociadas, da dispensa de pena e até do arquivamento do processo em sede de inquérito “se a pessoa prestar informações de boa-fé com base em suspeitas razoáveis que venham a produzir prova válida”.

“Ninguém é condenado com uma denúncia anónima. Tem de haver provas e essas provas têm de ser trazidas por quem conhece por dentro a organização, a prática dos crimes ou as redes”, concluiu.

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