Ao longo de seis anos da crise (entre 2007 e 2012), o número de utentes em consulta de psiquiatria com pensamentos suicidas aumentou quase 70 por cento, segundo revela um estudo coordenado pelo Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT) da Universidade de Coimbra.
O documento, integrado no projeto Smaile (Saúde Mental – Avaliação do Impacte das condicionantes Locais e Económicas), procurou avaliar “o efeito das condicionantes locais e económicas na saúde mental e no uso dos serviços de saúde mental em tempos de crise”, como resumiu a coordenadora, Paula Santana (do CEGOT).
A vantagem desta integração de vários estudos num só projeto permitiu apurar, através de diferentes resultados, “uma relação entre a crise a saúde mental”, complementou a investigadora.
Aumento das tentativas
A investigação alertou ainda para o aumento de 52 por cento das pessoas, em consulta nos cuidados psiquiátricos das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, que realizaram pelo menos uma tentativa de suicídio no período em causa.
Nos doentes internados nos serviços de psiquiatria da área referida, a evolução de 2007 para 2012 demonstrou que os grupos de utentes com tentativa de suicídio com um maior aumento de internamentos foram o das mulheres entre os 50 e os 64 anos (mais 52 por cento de internamentos) e o dos homens entre os 30 e os 49 anos (mais 34 por cento).
Graça Cardoso, uma das investigadoras envolvidas, considerou que o particular impacto nas mulheres pode estar relacionado com o facto de Portugal ter “uma alta taxa de ocupação” profissional das mulheres quando comparado com os restantes países europeus.
“Aspetos como redução de salários, despedimentos e dificuldades na gestão do orçamento familiar poderão ter tido um efeito particularmente intenso neste grupo”, complementou a psiquiatra, sublinhando que as dificuldades económicas “aliadas ao papel social que as mulheres desempenham” podem-nas tornar “num grupo mais vulnerável” em contextos de crise.
Saúde mental
Um outro estudo, também no âmbito do projeto Smaile, demonstrou que os jovens (menos de 35 anos) desempregados e com um nível de escolaridade mais elevado “são os que reportam pior saúde mental”, tendo por base um inquérito a 1609 residentes dos municípios de Amadora, Lisboa, Mafra e Oeiras.
O investigador Pedro Pita Barros acredita que isto se deve às “expectativas criadas com o acesso à formação superior, que sendo mais elevadas constituem um choque maior quando se dá a situação de desemprego”.