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Nova Lei da Cópia Privada

A Lei do Séc. XXI

Entrou em vigor na passada segunda-feira, dia 6 de Julho, a nova lei da Cópia Privada. Mas o estimado leitor, por acaso, sabe o que isso significa? A probabilidade de ter respondido, para dentro, “não, não faço qualquer ideia” é muito elevada. E, novamente por acaso, sabe em detalhe o que diz a lei ou se a mesma se justifica ou não? Arrisco dizer que a percentagem de leitores que responderam, mais uma vez, “não, não faço qualquer ideia” é ainda mais elevada do que na pergunta anterior. Ora se o leitor pertence a esses dois grupos de pessoas então está no local certo dado que esta crónica é, inteiramente, dedicada à referida lei. Está preparado para se revoltar? Espero que sim porque é isso que irá acontecer daqui a breves instantes.

Mas calma, vamos por partes. “Afinal o que é a Lei da Cópia Privada?”. Então, é uma lei que já existe desde 1998, tendo sido revista em 2004, e novamente agora em 2015. Basicamente abrange suportes físicos como cassetes, cd’s, dvd’s, etc e que agora vai passar a abranger também os suportes digitais (como os discos externos e as Pen USB por exemplo). A premissa da lei é que devemos de pagar uma taxa de utilização desses suportes (físicos ou digitais) compensando assim os autores pela (eventual) cópia privada das suas obras para esses suportes.

Está confuso? Não esteja, é mais simples do que parece. Vai perceber à primeira assim que ler um exemplo. Imagine que compra um disco externo para poder guardar num local seguro as fotos de família, os vídeos onde brinca com o seu filho e os documentos do trabalho que não pode mesmo perder. Com a entrada em vigor desta nova lei o que acontece é que ao comprar o referido disco externo vai pagar uma taxa extra sobre o seu preço normal. “Mas se eu vou guardar no disco externo fotos, vídeos e documentos produzidos por mim não deveria pagar a taxa uma vez que a mesma se refere a cópias de documentos da autoria de outros, certo?”.

Pois, em teoria…sim. Na prática…não.

Ou seja, em teoria tem razão na observação que fez dado que se pretende apenas guardar documentos da sua autoria não se justifica o pagamento da referida taxa. Mas a lei não vê as coisas dessa forma. A lei parte do princípio de que todos vamos, algum dia, copiar para esse suporte algo comprado por nós e que é da autoria de terceiros.

“E que suportes estão abrangidos por esta revisão da lei?”. Aqui está, na minha opinião, uma das chaves mestras da parvoíce desta revisão da lei. É que, salvo raras excepções, todos os dispositivos pagam esta taxa. Telemóveis? Pagam. Discos Externos? Pagam. Televisões? Pagam. Tablets? Pagam. Estante do IKEA? Pag…não, isso ainda não paga a taxa. Pelo menos por enquanto, mas nunca se sabe o dia de amanhã! Recapitulando: para o legislador somos todos “piratas”. Não há mas nem meio mas, somos piratas e pronto. Então, está ou não está, revoltado? Eu avisei-o caro leitor. Eu avisei-o!

“E para onde vai o dinheiro proveniente desta taxa?”. Boa pergunta. Digo-lhe já que vai achar piada à resposta. Quem recebe o valor destas taxas é a AGECOP (uma entidade criada para gerir estes dinheiros), que posteriormente os distribui pelas associações suas associadas (após tirar o seu quinhão para “custos próprios”, evidentemente). Sendo que essas associações (onde se inclui, por exemplo, a SPA) depois distribuem o referido valor pelos autores seus associados (mais uma vez, após tirarem o seu quinhão para “custos próprios”, claro). A divisão é feita tendo por base as vendas (físicas) das obras e apenas inclui os autores devidamente inscritos e pagantes de quotas destas mesmas associações (entidades privadas refira-se).

Resumindo, o dinheiro que chega mesmo às mãos dos autores é uma ínfima parte do total.

A grande questão é que os autores já viram os seus direitos defendidos antes, dado que recebem uma percentagem de cada obra sua que é vendida. Isto não se trata de outra coisa que não dupla taxação. É taxar algo que já está taxado por natureza, o que é desprovido de sentido, como é óbvio. Vivemos numa era de múltiplas plataformas e formatos. É impossível que esta lei tenha sido pensada por alguém da nossa era, não é?

“Ah, espera, assim combatemos a pirataria, é isso?”. Pois, aqui reside outra das chaves mestras da idiotice desta lei. A questão é que não é feita uma única referência à pirataria. A lei refere-se a tudo o que o leitor comprar…o que, por definição, retira da equação qualquer pirataria da conversa. Quem traz para esta conversa a pirataria quer apenas confundir os restantes e vencer uma discussão que sabe, à partida, que irá perder. Podem existir muitas formas de combater a pirataria, mas esta não é, de certeza, uma delas. Ponto final parágrafo!

“Como é que esta questão é tratada nos outros países? Mais algum país tem esta lei em vigor?”. Boa ideia, olhar para o exterior por vezes ajuda. O conceito de cópia privada existe em alguns países. Por exemplo, Inglaterra é o país que mais recentemente aderiu a esta lei tendo a mesma menos de um ano. Não é cobrada qualquer taxa porque na opinião do Governo o povo inglês nunca aceitaria pagar este tipo de taxas, considerando as mesmas “injustas e burocráticas”. Por sua vez em Espanha existe a cópia privada, e a correspondente compensação aos autores, mas esta é feita directamente do Orçamento de Estado. Mais uma vez Portugal é protagonista pelas piores razões. Para variar.

Tendo em conta o que eu já lhe contei, o quão inteligente o leitor é e o facto de viver no Século XXI (enquanto o legislador da revisão da lei permanece no Século XIX) a este ponto está a pensar: “Já sei, vou encomendar tudo directamente do estrangeiro, através da internet, e assim escapo à taxa!”. Lamento ser o portador das más notícias mas…não é assim tão certo que escape à nova taxa. A verdade é que as grandes cadeias (como a Amazon, por exemplo) são obrigadas a cobrar algumas taxas do país de destino, sendo que me parece óbvio que esta venha a ser incluída no lote. Em contrapartida nada o impede de ir a Badajoz e em vez de trazer caramelos, trazer telemóveis, tablets ou televisões. É menos prático, mas exequível.

Resumindo: esta é uma lei injusta, antiquada e que toma a parte pelo todo. Na minha modesta opinião não faz qualquer sentido taxar algo pela segunda vez, sobrecarregando ainda mais os consumidores. Mas é apenas a minha opinião, vale o que vale. Agora que o estimado leitor tem toda esta informação pode formar uma opinião sua e ficar a favor, ou contra, a revisão da Lei da Cópia Privada.

Para finalizar: querem saber a melhor parte desta nova lei? Querem? Querem mesmo? Então eu digo: à taxa em questão acresce o IVA. De 23% claro. Era mesmo o que faltava não era? É a chamada, cereja no topo do bolo.

P.S: Então, irritou-se ou não? Eu avisei que se ia irritar caro leitor. Eu avisei.

Boas compras seus piratas!

Até para a semana!

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