Ciência

Estudo associa cefaleias ao uso de equipamentos de proteção individual

Pesquisa revela que 56 por cento dos participantes desenvolveram cefaleias após uso daqueles equipamentos. Autores do estudo ressalvam, porém, que os cidadãos devem continuar a usar esses equipamentos, de acordo com as instruções das autoridades de saúde.

A Sociedade Portuguesa de Cefaleias (SPC) em conjunto com a MiGRA Portugal – Associação de Doentes com Enxaqueca e Cefaleias e com o centro de cefaleias do Hospital da Luz, desenvolveram um estudo com o objetivo de avaliar o impacto da utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) no aumento de crises de cefaleias na população portuguesa.  

Este inquérito revelou que 56 por cento dos inquiridos desenvolveu cefaleias após o uso prolongado destes equipamentos de proteção e que quase 90 por cento atribuem o início destas crises a este fator. 

“A decisão de realizar este inquérito prendeu-se, essencialmente, com o aumento do número de queixas por parte de doentes que já tinham crises de cefaleias, mas também de doentes que desenvolveram estas crises apenas devido ao uso de EPI.  Estas cefaleias foram descritas maioritariamente como bilaterais, tipo pressão, mais frequentemente afetando a testa e as regiões de aplicação dos EPI na zona cefálica (peri-ocular, nuca, vértex, atrás das orelhas)”, afirma Raquel Gil Gouveia, neurologista da Sociedade Portuguesa de Cefaleias. 

Neste estudo, que envolveu cerca de 5 mil participantes, 72 por cento já tinha história de cefaleia regular, 62 por cento com critérios de enxaqueca. Dentro desta população, mais de 90 por cento dos doentes afirmou que as crises agravaram, o que demonstra o real impacto do uso de EPI nesta população. Dentro destes resultados cerca de 97 por cento dos doentes tiveram um aumento da frequência de crises, 95 por cento um aumento da duração e/ou intensidade e ainda 92 por cento registaram uma pior resposta à terapêutica. 

“Estes são valores que acabam por ser alarmantes, especialmente quando falamos sobre uma pior resposta à terapêutica. Como profissionais de saúde temos de alertar a população para estas questões e olhar pelo seu bem-estar. O aumento do número de crises acaba por contribuir, também, para o aumento de incapacidade dos doentes, especialmente a nível laboral, local onde os doentes têm de estar permanentemente a utilizar um EPI. O teletrabalho pode ser assim uma opção para reduzir o impacto das medidas de proteção individual na população”, explica a neurologista. 

“A utilização de EPI tem conduzido a um agravamento das crises dos doentes com enxaqueca e cefaleias e a uma maior dificuldade em controlar as crises com a medicação aguda que normalmente utilizam, gerando mais faltas ao trabalho e maior dificuldade de dar apoio em casa” reforça Madalena Plácido, presidente da MiGRA Portugal. 

“Apesar deste impacto, é extremamente importante a utilização destes EPI na pandemia que atravessamos, pois não podemos colocar os doentes com cefaleias num risco acrescido”, ressalva.  

“Muitas vezes os doentes têm de justificar a empregadores e familiares porque é que estão piores, e ninguém acredita que está relacionado com a utilização das máscaras. Em muitas situações, os empregadores e mesmo familiares e profissionais de saúde colocam em causa se estas crises são realmente verdade. Este estudo vem ajudar-nos a mostrar que este impacto é real e, por isso, apelamos a todos, mas em especial às entidades patronais e familiares dos doentes, que tenham uma maior compreensão para com os doentes”, acrescenta Madalena Plácido. 

“Sugerimos evitar situações que necessitem da utilização de máscara por períodos prolongados, por exemplo recorrendo ao teletrabalho sempre que possível e evitando a permanência em espaços comerciais. No entanto, quando a utilização de EPI por períodos prolongados é necessária, podem ser tomadas algumas medidas no sentido de minimizar o impacto da sua utilização no agravamento das crises de enxaqueca e cefaleias. Muitos doentes referem que os descansos regulares com a remoção do EPI por curtos períodos (sempre garantindo a segurança necessária) ajudam a reduzir o impacto. Para além disso, reforçamos a importância de os doentes se manterem hidratados, uma vez que a desidratação é um dos grandes causadores de crises. Não saltar refeições e não fazer longos períodos de jejum, são também bons conselhos, que nos ajudarão a evitar algumas crises”, conclui. 

O estudo contou com 5064 participantes, dos quais 90.6 por cento mulheres, e idade média de 37 anos. Todos os distritos de Portugal tiveram representação, com destaque para Lisboa, Porto e Setúbal, com 20 por cento dos participantes a trabalhar na área da saúde. 

As cefaleias, como por exemplo a enxaqueca, são vulgarmente conhecidas por dores de cabeça, contudo são doenças neurológicas que provocam uma dor incapacitante que podem ter outros sintomas associados.  

A Organização Mundial de Saúde identificou as cefaleias como o distúrbio neurológico mais frequentemente relatado nos cuidados primários, sendo a enxaqueca um dos mais comuns, que afeta cerca de um milhão e meio de pessoas em Portugal. 

As cefaleias foram consideradas a segunda causa de anos vividos com incapacidade na população portuguesa dos 5 aos 49 anos. Estas estão também entre as doenças mais comuns do sistema nervoso e afetam cerca de metade da população mundial, apesar de serem muitas das vezes desvalorizadas pela população geral.  

Provocam crises muito incapacitantes e têm um grande impacto não só no desenvolvimento de funções pessoais, mas também têm consequências na vida social, familiar e profissional e consequente impacto económico significativo. 

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