Uma troca de urnas está no centro de um processo que hoje começou no Tribunal de Vila Franca de Xira. O arguido confessou ter pago ao coveiro para este entregar-lhe a urna da avó, com o intuito de posteriormente exigir uma indemnização à Junta de Freguesia.
Duas urnas e um suborno de 100 euros centraram as atenções, hoje, no Tribunal de Vila Franca de Xira.
Na primeira audiência de um processo por crimes de corrupção e profanação de cadáver, foram ouvidos os três arguidos, um casal (ele com 31 e ela com 28 anos) e um coveiro, de 54 anos. Só os dois homens se pronunciaram, pois a mulher recusou prestar depoimento.
O caso teve início em 2009, quando o principal arguido alegou que a urna da avó tinha desaparecido durante algumas semanas, sem que a Junta de Freguesia de Alverca (JFA) lhe desse qualquer justificação.
O processo terminou arquivado, mas ainda corre uma ação cível nos tribunais administrativos por “danos morais”.
“Sem controlo”
Como vingança, o homem terá planeado pagar ao coveiro para que este lhe entregasse a urna da avó e, posteriormente, exigir uma indemnização à JFA (alegando erro nos serviços), acusação rejeitada pelo principal arguido.
Confessando ter pago 100 euros ao coveiro, o homem alegou em tribunal que apenas pretendia “demonstrar que era possível qualquer pessoa retirar as ossadas do cemitério sem qualquer controlo”.
A urna terá ficado guardada durante quatro meses, período em que no ossário do cemitério estava uma outra urna. Foi um gesto “generoso” do coveiro, afirmou o principal arguido, e que serviu de justificativa para o pagamento de 100 euros.
“Enganou-me”
O principal arguido tentou também ilibar a companheira, garantindo que ela “nunca soube” das verdadeiras intenções: levar para casa a urna com as ossadas da avó.
Esta tese foi desmontada, na mesma sessão, pelo coveiro, que se afirmou “enganado” pelo outro arguido.
“O que ficou combinado é que ele só levava os ossos”, afirmou: “no dia em que era para levar os ossos, acabou também por querer levar a urna. Ele enganou-me”.
Já fora do tribunal, o coveiro, que retomou as funções após uma suspensão de quatro meses, afirmou aos jornalistas que aceitou o dinheiro por “necessidade”: na altura, preparava-se para ir de férias.
Reunião com a JFA
O tribunal ouviu ainda a funcionária da JFA que tem lidado com a burocracia do caso do desaparecimento da urna, em 2009.
A técnica confirmou a existência de um fax , enviado pela advogada do principal arguido a setembro de 2011, a solicitar uma reunião com o executivo, a qual ocorreu em novembro.
Nesse encontro, coube à advogada (a mesma que agora defende o arguido) pedir à JFA uma indemnização pelo desaparecimento da urna, ameaçando recorrer aos tribunais se a mesma não fosse paga.
A JFA, continuou a funcionária, terá rejeitado de imediato essa pretensão.
Corrupção e profanação
O Ministério Público acusa o casal de corrupção ativa e de profanação de cadáver, enquanto o coveiro responde por corrupção passiva e coautoria na profanação de cadáver.
O despacho de acusação, citado pela Lusa, salienta que o casal pagou, em julho de 2011, “100 euros” ao coveiro para que este entregasse “uma urna com uma ossada completa, não identificada e considerada abandonada”.
Com essa urna, o homem “dirigiu-se ao ossário da avó e trocou a urna da familiar pela que tinha sido entregue pelo coveiro”.
A urna com as ossadas da avó foi transportada na bagageira do carro para a casa do casal, que “manteve a urna na despensa da habitação durante quase quatro meses”.
Foi quando o casal tentava devolver a urna ao cemitério de Alverca, a 26 de novembro de 2011, que acabou detido pelas autoridades.
O julgamento continua a 11 de abril.