O ciclone Kenneth derrubou a casa de Maurício Valério, 53 anos, em Macomia, Norte de Moçambique, poucos minutos depois de ele de lá fugir com o resto da família, 13 pessoas ao todo, oito das quais crianças.
“Escondemo-nos. Ficámos agarrados uns aos outros, longe das árvores altas” e foi assim que sobreviveram, ao relento, na noite escura de quarta para quinta-feira, à passagem do primeiro ciclone de que há registo no Norte de Moçambique, província de Cabo Delgado.
“As crianças estavam ao nosso colo”, recorda-se, agora que limpa os escombros da casa de adobe, capim e estacas.
Maurício teve que improvisar uma espécie de tenda com estacas e plásticos pretos para albergar a família alargada de 13 pessoas que inclui filhos e netos.
É ali que todos e juntam à noite e é ali que todos partilham as refeições.
Um frigorifico, algumas camas em bambu, roupa, tachos e panelas, tudo empapado em água e lama, está ali no meio da rua, numa clareira junto a um caminho em terra, capim e palmeiras, um bairro igual aos outros de Macomia.
Hoje também é igual aos outros ao nível da destruição.
Em todos os bairros há árvores e postes de eletricidade tombados, chapas de zinco que já foram telhados espalhadas por todo o lado, dobradas, prova de que foram arrancadas, enroladas em cabos elétricos – a vila continua sem eletricidade – e casas precárias caídas por todo o lado.
Só parte das barraquinhas de madeira do mercado central sobreviveu, o resto está debaixo de árvores.
A bomba do principal posto de combustível da vila foi arrancada do chão, tal como o edifício de um dos principais bancos, transformado numa amálgama de ferros retorcidos.
Vários edifícios públicos ficaram sem telhado, como a sede do governo distrital, outros foram destruídos por árvores, como a maternidade da vila ou o comando da polícia.
Wild Eusébio, professor, anda pela rua com uma vassoura na mão.
O teto da sua casa voou e tudo que o que lá estava perdeu-se.
“Procuro alguém que me ceda uma varanda (alpendre) que eu possa limpar para lá ficar com a minha família”, que agora está abrigada debaixo de uma tenda improvisada com duas chapas largas que Wild encontrou na rua.
O céu está cinzento, mas desde a noite do ciclone que o vento desapareceu e a chuva voltou ao registo normal.
Toda a população anda nas ruas, atarefada, a carregar chapas, madeira e em inúmeros afazeres enquanto se ouvem marteladas como se a vila fosse agora um estaleiro.
E com o grau de destruição que se vê por todo o lado, ainda o deverá ser durante muito tempo.
Segundo o último balanço das autoridades feito na sexta-feira, a passagem do ciclone Kenneth no norte de Moçambique fez duas vítimas mortais.
Pelo menos, 16 mil pessoas foram afetadas pelo ciclone e há mais de 18 mil pessoas nos 22 centros de acomodação, adiantam as autoridades.
Quase três mil habitações ficaram parcialmente destruídas e 450 ficaram totalmente destruídas.
O ciclone Kenneth, que chegou esta quinta-feira ao norte de Moçambique, foi classificado com a categoria quatro, a segunda mais grave, com ventos contínuos de 225 quilómetros por hora e rajadas de 270 quilómetros por hora, segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitário (OCHA).
A 14 de março, Moçambique já tinha sido atingido pelo ciclone Idai, que provocou pelo menos 603 mortos.
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