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Programa de treino contra violação, no Canadá, tem tanto sucesso como críticas

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No Canadá, as mulheres que frequentam as instituições de ensino superior podem inscrever-se num programa que tem por finalidade evitar a violação. O EAAA tem vindo a ser bem sucedido ao longo de uma década, mas os elogios que recebe são tantos como as críticas.

É possível ‘treinar’ uma mulher para esta evitar ser violada?

Esta é a pergunta do momento no Canadá e nos EUA, depois da revista New England Journal of Medicine ter publicado, ontem, o sumário de um programa que decorre com quase 900 jovens de três universidades no Canadá.

O EAAA, o acrónimo em inglês para ‘Programa Avançado de Reconhecimento e Resistência ao Abuso Sexual’, tem vindo ser promovido, há mais de uma década, por Charlene Senn, professora da Universidade de Windsor.

Ao longo das quatro sessões de três horas, as universitárias foram ‘treinadas’ em “informações, habilidades e práticas para avaliar o risco em conhecidos, superar barreiras emocionais na percepção do perigo e utilizar de maneira eficaz técnicas de auto-defesa verbal e física”.

Ora, segundo os dados publicados ontem na New England Journal of Medicine, os investigadores comprovaram a eficácia na redução do número de mulheres vítimas de abuso sexual no Canadá, um país onde uma em cada quatro mulheres são violadas ou sofrem tentativas de abuso sexual, isto só durante o período em que frequentam o ensino superior.

No final do primeiro ano depois de integrarem o EAAA, as mulheres que frequentaram o programa sofreram menos 46 por cento de violações e menos 63 por cento de tentativas do que as colegas que não tinham ‘treinado’ (o grupo de controlo).

Segundo Charlene Senn, estes dados mostram que o EAAA é o primeiro programa deste género a ter sucesso a longo prazo na América do Norte.

“O que este estudo nos mostra é que, enquanto esperamos que aconteçam programas eficazes para os homens ou para mudanças culturais nas atitudes, há algo prático que podemos fazer para dar às jovens as ferramentas que elas precisam para melhor se protegerem da agressão sexual”, argumentou.

Só que os elogios, como o editorial da New England Journal of Medicine, são tantos como as críticas, com a mais notória a ser a possibilidade deste ‘treino’ implicar um desvio da responsabilidade dos violadores para as vítimas.

Kathleen Basile, cientista comportamental e especialista em violência sexual nos Centros para Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, afirmou que a grande fraqueza do EAAA é colocar “o ónus da prevenção nas possíveis vítimas, possivelmente obscurecendo a responsabilidade de seus autores e outros”.

Basile deu voz à pergunta mais vezes repetida: “O que acontece quando as mulheres que completam o treinamento não conseguem impedir com sucesso uma violação?”

“As abordagens focadas apenas nas mulheres usadas isoladamente para a prevenção não só desviam a responsabilidade dos potenciais perpetradores, mas também representam uma solução parcial”, considerou a investigadora: “Nós podemos ter melhores resultados através de esforços combinados que também incidem sobre potenciais violadores, espetadores e mais amplas influências a nível da comunidade”.

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