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Pessoas fazem equilíbrio para atravessar rio que arrastou ponte e cortou região em Moçambique

Macomia, Moçambique, 27 abr 2019 (Lusa) – Moahmed Cassamo leva um bebé ao colo, uma mala pela mão e caminha devagarinho para não cair das tábuas improvisadas entre a estrada e o tabuleiro da ponte sobre o rio Muangamula, no Norte de Moçambique.

“Na quarta-feira passei aqui e não estava assim, estava transitável”, comenta, admirado, ao ver os estragos provocados pelo ciclone Kenneth, com a ponte tombada e separada da margem sul, nos arredores da vila de Macomia.

A arrastamento de parte da travessia sobre o rio Muangamula é o caso mais grave ao nível dos prejuízos em infraestruturas provocado pela tempestade inédita na região: fica partida ao meio a única estrada asfaltada que liga a província de Cabo Delgado de norte a sul.

Vários distritos a norte – tais como Mueda, Mocímboa da Praia e Palma, onde estão em construção os megaprojetos de gás natural do país – ficam sem ligação a Pemba, capital provincial, a sul, e ao seu aeroporto internacional.

“Vou passar, vou tentar, na medida do possível”, disse Moahmed Cassamo à Lusa, antes de dar uns 20 passos pelas tábuas e chegar ao outro lado.

Como ele, seguem dezenas de pessoas que viajavam de Macomia, no centro de Cabo Delgado, até Mocímboa da Praia, quase no topo norte.

Saem todas do autocarro, carregam bagagens e levam crianças ao colo para a outra margem, onde um outro autocarro os espera para seguir viagem.

“Também vou tentar, com cuidado”, refere Regina Ernesto, igualmente com um bebe, seguro numa capulana (tecido) a tiracolo.

“Eu já esperava isto, depois do q se passou na Beira”, refere Emílio Mataveira, de bagagem na mão, referindo que o Idai já tinha mostrado a força que pode ter um ciclone.

“Agora, aqui, não há remédio. Vamos ter que carregar” e empurra as malas.

Uma outra dezena de pessoas, funcionários da administração local de Macomia, empurra troncos, alinhas tábuas e prega tudo num conjunto o mais sólido possível para seja possível, pelo menos, haver circulação de pessoas sobre o rio.

Os carros só devem voltar a passar “dentro de quatro a cinco dias”, estima o ministro das Obras Públicas, João Machatine, que se encontra no local a fazer um levantamento dos trabalhos necessários.

O cenário mostra bem a força “brutal” das águas incitada pelo ciclone, referiu o ministro à Lusa.

A intempérie encheu o rio com tanta água e tão depressa na noite de quinta-feira que o caudal empurrou os apoios de betão armado do tabuleiro metálico.

“Vamos fazer um desvio, cujas obras devem arrancar ainda hoje”, para contornar a zona da ponte, agora que as águas estão novamente baixas, para que assim se possa retomar a circulação, destacou.

Entretanto, a ponte deve ser reparada.

Os trabalhos vão ser feitos por uma empresa que está a construir quatro pontes da estrada nacional 380 (EN 380), entre Macomia e Mocímboa, para substituir as existentes – sendo que a própria ponte que foi arrastada pelas águas está nos planos.

Macomia, ali ao lado, é vila sede de um distrito com cerca de 100 mil habitantes e foi a principal povoação a ser atingida pelo ciclone Kenneth, o primeiro que de que há registo a atingir o norte de Moçambique.

A própria vila vive muito da EN 380, por estar incrustada praticamente a meio do percurso de cerca de 400 quilómetros entre norte e sul de Cabo Delgado – ponto de encontro de muitos comerciantes e local de paragem quase obrigatório para viajantes que ali encontram o único posto de combustível da ligação, bem como alojamentos e restauração.

Tudo isso foi severamente danificado com o ciclone Kenneth, que entrou pelo mar e varreu a região ao meio: apesar de a vila ter cobertura de banda larga pelas redes móveis, continua sem eletricidade e é ainda um emaranhado de cabos elétricos estendidos no chão, por entre coqueiros e outras árvores, bem como escombros de habitações precárias.

A vila assemelha-se hoje, durante o dia, a um estaleiro e à noite é local de lamentos, porque muita gente ficou sem casa ou sem teto: é rara a família que não tenha de dar guarida a mais alguém ou improvisar um teto com plásticos ou chapas encontradas na rua, enquanto se descobrem soluções para reconstruir casas.

O número de mortos provocados pela passagem do ciclone Kenneth, no norte de Moçambique, aumentou para cinco, revelou hoje o primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, numa conferência de imprensa na cidade de Pemba.

Até ao momento quase 3.500 casas foram parcial ou totalmente destruídas, pelo menos 16 mil pessoas foram afetadas pelo ciclone e há mais de 18 mil pessoas em 22 centros de acomodação.

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