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Moçambique/Ataques: Ausência do Estado poderá agravar radicalização do conflito no norte do país – ONG

O diretor do Centro Africano para a Resolução Construtiva de Disputas (ACCORD, na sigla em inglês) considerou hoje à Lusa que a ausência do Estado poderá levar ao agravamento da radicalização do atual conflito armado no norte de Moçambique.

“A possibilidade de uma radicalização da população em Cabo Delgado e o aumento da violência extremista existe, e o Governo [moçambicano] deveria atender com prioridade a essa realidade”, adiantou à Lusa Vasu Gounden, fundador e diretor executivo daquela organização não-governamental.

O responsável, que falava à margem de uma conferência sobre a ameaça do extremismo violento em Cabo Delgado, norte de Moçambique, realizada em Pretória pela União Europeia juntamente com parceiros internacionais e regionais, referiu que o gás natural é “receita para benefícios para o país, mas é também uma receita para um desastre” se não for gerido adequadamente.

“O gás natural deve ser gerido de forma a que beneficie toda a população de Moçambique e, em particular a de Cabo Delgado, de forma a que a população tenha acesso a serviços básicos e não se torne vulnerável à radicalização”, salientou.

Questionado pela Lusa sobre a génese do atual fenómeno de violência naquela província do norte de Moçambique, Vasu Gounden considerou que se deve a décadas de conflito armado entre a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), na oposição, e a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder desde 1975.

A Frelimo iniciou a sua luta de libertação armada contra o então regime colonial português na província de Cabo Delgado há cerca de 60 anos.

“Devido a esse conflito, aquela parte do país [Cabo Delgado] não dispõe de uma governação efetiva por parte de qualquer um dos dois partidos dados os desafios que a Renamo teve e aos desafios do processo de paz”, declarou.

Todavia, adiantou Gounden, “espera-se que o Governo de Moçambique detenha um controlo mais efetivo sobre o seu território, mas se o vazio continuar, irá certamente ser ocupado por alguém”, salientou.

“Em qualquer situação onde houve um conflito armado, se as estruturas que foram criadas no passado, sejam de contexto revolucionário ou de libertação, não forem desmanteladas ou reintegradas, irão persistir como um problema”, afirmou à Lusa o diretor da ACCORD.

A conferência, subordinada ao tema “Como lidar com o extremismo violento na África Austral”, foi organizada pela União Europeia (UE) em coordenação com parceiros regionais, nomeadamente o Instituo de Estudos Segurança (ISS) da África do Sul, e reuniu hoje na capital sul-africana investigadores, académicos, diplomatas e especialistas em terrorismo internacional e segurança regional, para analisar o fenómeno emergente de grupos radicais em Moçambique e no sul de África.

Em alguns pontos do Norte e Centro de Moçambique, especificamente em Cabo Delgado, Sofala e Manica, grupos armados têm protagonizado ataques armados contra viaturas civis, autoridades e aldeias.

Os ataques de grupos armados na província de Cabo Delgado eclodiram há dois anos em comunidades muçulmanas radicalizadas.

Pelo menos 300 pessoas já morreram, segundo dados oficiais e de testemunhas, e 60.000 foram afetadas ou obrigadas a abandonar as suas terras e locais de residência, de acordo com a mais recente revisão do plano global de ajuda humanitária das Nações Unidas.

Desde junho que o grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico tem reivindicado alguns dos ataques, mas autoridades e analistas ouvidos pela Lusa têm considerado pouco credível que haja um envolvimento genuíno do grupo terrorista que vá além de algum contacto com elementos no terreno.

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