Uma menina de 10 anos foi violada pelo padrasto e vai ser mãe, uma vez que o aborto é ilegal no Paraguai. A mãe da criança está presa, o padrasto/avô do feto fugiu. “Nós devemos proteger a menina”, justifica a juíza encarregue do processo.
Pode uma menina de 10 anos, com 1m39 metros de altura e 34 quilos de peso ser mãe? Pode, no Paraguai, onde a Constituição “protege a vida desde a concepção”, como refere a tutora legal da menina em causa, a juíza Pili Rodríguez.
Em declarações ao El País, a magistrada resumiu a situação que está a indignar a comunidade internacional: uma menina de 10 anos foi violada pelo padrasto, em Luque. Está grávida de cinco meses e a mãe foi presa, por alegada cumplicidade, enquanto o padrasto fugiu, num país onde a lei só permite o aborto quando em causa está o risco de vida da progenitora.
Como o pai biológico está ausente há muito tempo, a menina de 10 anos não tem tutor legal, pelo que ficou à guarda de uma juíza do Tribunal de Menores de Luque, a citada Pili Rodríguez.
“Não se conhecem, aqui no Paraguai, casos de médicos que tenham interrompido uma gravidez de meninas. Até agora, as informações dos médicos não referem qualquer risco para a saúde da menina. São os médicos que decidirão, não o tribunal”, salientou a magistrada.
Na história do país, só existiu um aborto ‘oficial’: foi em 2009, devido a uma gravidez ectópica (e só após muita pressão das organizações humanitárias e da comunidade internacional).
“Nós devemos proteger a menina, visto que o pai está ausente há muito tempo, a mãe está na cadeia e o padrasto foragido”, acrescentou Pili Rodríguez: “O que temos de fazer é rever o sistema de prevenção para que isso não volte a ocorrer”.
A decisão da justiça não é fácil de aceitar, sobretudo por parte dos ativistas. “Formalmente, este é um Estado laico, mas há muita pressão de setores conservadores”, lamentou María José Garcete, da Amnistia Internacional do Paraguai.
“É um atentado contra os direitos humanos. Ela é muito frágil, isso atenta contra a convenção dos direitos da criança que o Paraguai assinou”, acrescentou Elba Núñez, da organização não governamental CLADEM, lembrando que a mãe da menina havia denunciado, no ano passado, o companheiro por carícias feitas à menina. Só que o caso morreu antes sequer de ter começado…
“A reação do Estado foi criminalizá-la e colocá-la na prisão, onde teme pela vida porque as demais presas a culpam. A menina agora está separada da família, só pode ver as tias por duas horas, é uma tortura tremenda para uma criança”, frisou.
“O Estado paraguaio falhou”, insistiu Elba Núñez: “A mãe foi quatro vezes denunciar os possíveis abusos à filha e foi ela quem, há 13 dias, levou a menina ao médico. O primeiro que a viu falou dos riscos para a vida e por isso ela pediu a interrupção da gestação para salvar a vida da filha. Deixaram passar o tempo e agora dizem que é tarde demais”.