Ciência

Estudo conclui que primeiros agricultores da Europa Central viveram em igualdade

Um grupo internacional de investigadores, do qual faz parte Daniel Fernandes, investigador do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), produziu o conjunto mais completo de dados genéticos do Neolítico Inicial da Europa Central até à data.

Os resultados deste estudo, liderado por Pere Gelabert e Ron Pinhasi, da Universidade de Viena, e David Reich, da Universidade de Harvard, acabam de ser publicados na Nature Human Behaviour. E revelam que a cultura responsável pela expansão da agricultura na Europa Central há 8 mil anos não mostrou sinais de estratificação populacional.

A expansão da agricultura na Europa Central ocorreu no sexto milénio a.C., em poucas gerações, os agricultores da região dos Balcãs expandiram-se pelo vale do Danúbio até à atual França e, para leste, até à atual Hungria e Ucrânia. Os vestígios culturais dos agricultores são homogéneos em toda esta área, estendendo-se por milhares de quilómetros, mas a falta de dados genéticos de várias famílias torna difícil perceber se estas comunidades viviam em igualdade social, ou avaliar quais foram os indivíduos que migraram pelo continente.

Mais de 80 geneticistas, antropólogos e arqueólogos, que estudam as particularidades sociais da Cultura de Cerâmica Linear (Linearbandkeramik, LBK), integraram novos dados genéticos de mais de três centenas de indivíduos com extensos conjuntos de dados: estudos ósseos, datas de radiocarbono, contextos de sepultamento e dados dietéticos. «O estudo das ligações genéticas entre mais de 250 indivíduos neolíticos mostrou que o povo LBK se expandiu ao longo de centenas de quilómetros em apenas algumas gerações», revela Daniel Fernandes, coautor do estudo.

“Encontrámos com sucesso parentes distantes na Eslováquia e outros na Alemanha Ocidental, a mais de 800 km de distância”, evidencia o primeiro autor, Pere Gelabert, cientista do Departamento de Antropologia Evolutiva da Universidade de Viena.

Ron Pinhasi, investigador na mesma universidade, explica que, neste estudo, “é relatado pela primeira vez que as famílias nos locais de estudo de Nitra, na Eslováquia, e Polgár-Ferenci-hát, na Hungria, não diferem em termos dos alimentos que consumiram, dos bens funerários com que foram enterradas ou das suas origens”.

“Tal sugere que as pessoas que viveram nestes sítios neolíticos não foram estratificadas com base no sexo familiar ou biológico, e não detetámos sinais de desigualdade, entendida como acesso diferencial a recursos ou espaço”, afirmam os investigadores.

A cultura LBK chegou ao fim por volta de 5000 a.C., e várias hipóteses foram propostas sobre seu colapso. Alguns sugerem que foi um período de crise social e económica, muitas vezes associado a episódios de violência generalizada. Um dos eventos mais famosos é o Massacre de Asparn-Schletz (Baixa Áustria), onde mais de uma centena de indivíduos foram recuperados de um sistema de vala. Juntamente com Herxheim (Alemanha), este local representa um dos maiores conjuntos conhecidos de indivíduos mortos violentamente durante o Neolítico Inferior, com esqueletos que mostram sinais de violência e múltiplas fraturas.

O grupo de investigadores destaca ainda que “este estudo genético meticuloso dos indivíduos Asparn-Schletz mostrou que menos de dez estavam geneticamente relacionados, o que desafia a hipótese de que o massacre representou uma única população”.

Estudos antropológicos anteriormente realizados por uma equipa de bioantropólogos liderada por Maria Teschler-Nicola, do Museu de História Natural de Viena, notaram uma falta de mulheres jovens, e os novos dados confirmam ainda mais uma ausência completa de familiares. A presença de muitas crianças entre as vítimas abre a porta a múltiplas interpretações deste acontecimento marcante da violência neolítica.

O artigo científico “Social and genetic diversity in first farmers of central Europe” está disponível para consulta.

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