Mundo

Diretor de centro social teme agitação em caso de novo referendo no Reino Unido

O diretor de um centro comunitário na cidade inglesa de Hartlepool, uma das mais pobres do Reino Unido e onde quase 70 por cento dos eleitores votaram Brexit, teme que um segundo referendo provoque agitação civil no país.

“Acho que vamos ter agitação civil no país se houver um segundo referendo e penso que as pessoas nunca mais votariam. Nunca. Essa é a sensação mais forte que eu tenho, que as pessoas nunca mais se dariam ao trabalho de votar porque seria uma absoluta perda de tempo”, disse Sacha Bedding, em entrevista à agência Lusa.

Sacha Bedding é o diretor do The Annex, um centro comunitário que serve uma população de 40 mil pessoas num dos bairros mais pobres de Hartlepool e sente que a revolta que levou os eleitores da cidade a votar massivamente para retirar o país da União Europeia em 2016 se agravou quando, três anos e meio depois, o assunto ainda não está resolvido.

“Penso que o argumento entre o bom e o mau foi quase ultrapassado pelo argumento do certo ou errado […]. [As pessoas pensam]: ‘Votei para sairmos e, se ignorarem isso, é um ataque pessoal à democracia. A minha voz está mais uma vez a ser ignorada'”, disse.

Bedding disse à Lusa que já em 2016 o voto massivo no Brexit em Hartlepool foi para mudar o ‘status quo’, porque as pessoas se sentiam irrelevantes, ignoradas pelo poder em Londres há demasiados anos.

No entanto, devido a uma série de adiamentos e chumbos no Parlamento, o Brexit ainda não se concretizou, e a mensagem mais frequente quando se aborda as pessoas nas ruas de Hartlepool é que todos os políticos são iguais, são mentirosos e falharam em concretizar algo que deveria ser relativamente fácil.

Agora Bedding teme pelo futuro e diz que pela primeira vez na vida compreende como é que, num país civilizado como o Reino Unido, se criam condições para uma guerra civil.

“Não acredito que venha a haver uma guerra civil, mas compreendo como é que as pessoas chegam a esse ponto, por causa do nível de raiva. A lei e a ordem estão baseadas na democracia. Neste momento as pessoas sentem que a democracia está a ser ignorada, e a lei e a ordem dependem disso”, disse, recordando que o desespero leva as pessoas a questionar o que mais podem fazer.

Bedding lamenta ainda que, “aconteça o que acontecer, metade do país vá ficar profundamente infeliz com o resultado”.

É que a bipolarização da sociedade devido ao Brexit é real: “Há famílias em que as pessoas não falam umas com as outras. Há pessoas que têm cuidado com o que dizem em público, com medo de represálias”.

“Penso que, quer saiamos quer fiquemos na União Europeia, vamos ter de reconstruir a paz neste país. E não há nenhum político no país que consiga fazê-lo” porque todos já tomaram partido, lamentou ainda o responsável, assumindo que provavelmente será o setor social a assumir esse papel.

Para Bedding, com Brexit ou sem ele, o país vai continuar a funcionar, as empresas vão resolver os seus problemas, os medicamentos vão chegar às pessoas, com mais ou menos impostos.

“Mas este sentimento de identificação entre as pessoas, o conflito emocional… É aí que está o grande desafio. Restruturar a economia não é nada comparado com restruturar a sociedade. É isso que temos de fazer e é um desafio muito, muito maior”.

Em destaque

Subir