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“Em dez anos vamos estar em condições de ter uma tragédia maior”, avisa especialista

O Governo reagiu finalmente aos grandes incêndios de outubro, prometendo medidas que foram anunciadas a seguir aos incêndios de 2003 e de 2005. Para Henrique Pereira dos Santos, estamos numa rota de dez anos “para o fogo absolutamente desastroso de 2030”.

Não é o aviso de ‘um velho do Restelo’. Henrique Pereira dos Santos é arquiteto paisagista e tem investigado a evolução do ‘Portugal rural, aquele que arde com impossível regularidade. Deu uma entrevista de fundo ao Observador a propósito das conclusões do Conselho de Ministros de sábado.

“Não sei o que foi aprovado, não consigo perceber”, frisa o especialista: “Grande parte daquilo que vejo anunciado são coisas do ‘vamos ver’, mas depois não se percebe” como é que na prática vão prevenir os incêndios.

E deixa exemplos, como a referência à limpeza das estradas: “Isso é o quê? Tem quantos dias [para ser feito]? Quantos meios? Quem paga? De que forma é que vai ser feito? Vai ser sistemático?”

“São coisas no sentido certo, mas não sei o que significam na prática”, insistiu Henrique Pereira dos Santos, acrescentando que… já tinha ouvido o mesmo após os grandes incêndios de 2003 e 2005.

“O tipo de conversa foi exatamente o mesmo”, garantiu: “O reforço da Proteção Civil do ponto de vista do Estado, a conversa dos sapadores… Essa história do combate aéreo faz-me icterícia, na prática não tira nem põe, isso já foi testado e não funcionou”.

“Não vi uma linha sobre a alteração das estratégias e das opções políticas de gestão do mundo rural. Não vi, em lado nenhum, o Governo assumir que de facto o Programa de Desenvolvimento Rural ou os apoios do mundo rural devem caminhar no sentido de criar uma melhor remuneração dos serviços do ecossistema. Sobre isso, zero. Sobre economia, zero. Sobre aquilo que pode contribuir para uma gestão de combustíveis, zero”, insistiu o autor do livro Portugal: Paisagem Rural.

Para Henrique Pereira dos Santos, a ilusão mantém-se: “O que vai acontecer é que o Governo vai fazer estas coisas todas e como, em dois anos, arderam praticamente 650 mil hectares de florestas seguidos nas zonas mais perigosas, que são as zonas que não têm gente e que, portanto, não têm atividade económica, gestão, etc., durante oito a dez anos a probabilidade de haver uma situação como esta baixou drasticamente. Foi a maior limpeza de combustíveis que alguma vez foi feita. Durante estes oito a dez anos, este Governo e os outros — porque vai ser igual –, vão dizer que as estatísticas são boas e que as opções que fizeram foram boas e que estão a resultar”.

“O primeiro-ministro diz que as transformações de fundo demoram muito tempo, mas para o ano já vai dizer que ardeu menos. Ao fim de dez, vamos estar em condições de ter uma tragédia que não é igual, é maior”, antecipou este especialista.

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