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Deve o Turismo ser regulado (e taxado)?

Todos concordamos que nunca se falou tanto de turismo como agora. E concordamos também, julgo eu, que parece que nunca se viajou tanto como actualmente. E quando digo “viajar” não me refiro apenas a muitas horas de avião e a destinos paradisíacos: passar férias no Minho ou no Algarve continua a ser viajar! Mas com tantos milhões de pessoas a circular pelo mundo fora torna-se fundamental pensar o turismo. Sim, “pensar” o turismo. Como deve ser regulado o turismo? Devemos de taxar o turismo? Se sim, como? Nesta crónica vai encontrar esta, e outras, pergunta(s) assim como a(s) respectiva(s) resposta(s)!

As estatísticas não enganam e as contas bancárias também não: nunca Lisboa foi tão falada, tão visita e tão popular como agora. Tanto em Portugal como no estrangeiro todos os dias encontramos peças de jornal, de telejornal, de sites noticiosos, liderança de tops de cidades a visitar, contas de Facebook e Instagram com fotos e textos maravilhosos, e muito mais que nem sequer imaginamos. Lisboa está na moda (Portugal também, mas não tão quanto Lisboa, reconheçamos).

Contudo esta vaga de visitantes traz novos problemas e novos desafios. De repente Alfama, a Mouraria ou a Graça estão cheios de espanhóis, russos, colombianos e sabe-se lá que outras nacionalidades. Nas esplanadas facilmente ouvimos falar inglês, mandarim, italiano ou japonês mas muito raramente português. As ruas estão infestadas de autocarros e tuk tuk pelas ingrimes colinas da capital, todas cheias de turistas que fotografam cada centímetro de calçada. E tudo isto é muito bonito, claro. Bonito e “agradável” (para os cofres nacionais, entenda-se). Mas, tem de ser pensado e regulado.

Queremos quantidade? Queremos pois. Mas acima de tudo temos de querer qualidade. Eu explico: imaginem que em 2016 Lisboa tinha o dobro dos turistas que teve em 2015, isso seria bom? De repente qualquer um de nós dirá que sim. Mas, na prática, talvez a resposta seja antes um redondo “não”. É que todos esses turistas iam “inundar” a capital, desvirtuando assim os bairros históricos, fazendo com que a magia da noite lisboeta se perdesse, causando o caos nos bares e discotecas, etc. Sim, gastariam o seu dinheiro cá (e nós bem precisamos dele, não sejamos hipócritas), mas também trariam muitos novos problemas. Lisboa é uma atracção mundial precisamente por se manter fiel aos seus princípios, à sua magia e à sua história.

Vamos agora a alguns exemplos de cidades que “pensaram” o seu turismo. Comecemos pela Dinamarca: foram criadas “zonas silenciosas”, foi limitada a compra de casas a estrangeiros assim como o número de bares/discotecas na capital. Calma, eu explico. As “zonas silenciosas” são bairros sinalizados onde não é permitido fazer barulho a certas horas do dia ou da noite (como devem imaginar as zonas escolhidas foram bairros mais antigos, históricos e onde a população é, em média, mais envelhecida). Mesmo os autocarros repletos de turistas têm de cumprir esta lei (sujeitando-se a pesadas multas caso tal não suceda). Quem ganha com isto?

Os moradores, claro. Conseguiram manter os turistas e garantir que dormem de noite. Quanto à limitação da compra de casas é fácil de perceber: a alma daquela cidade são os dinamarqueses, as suas tradições, os seus hábitos e a sua cultura. Logo se as pessoas forem deixando de ali viver essa alma perde-se. Com esta medida garante-se que os cidadãos nacionais continuam ali a morar, que continua a existir espaço para os estrangeiros que ali desejarem casa e que a alma da cidade não se perde e o turismo continua a florescer. A terceira medida mencionada acima também não tem mistério nenhum. O controlo dos locais de divertimento nocturno tem como objectivo garantir que não existe excesso de oferta e que a mesma não chega a certas zonas da cidade (como por exemplo os tais bairros de que acabei de falar). Assim continuam a existir espaços para sair à noite e tomar uma bebida com os amigos sem incomodar os habitantes locais. Ou seja? A Dinamarca “pensou” o turismo da sua capital.

Se na Europa, e em Lisboa, temos turistas de todo o mundo (não havendo uma nacionalidade a “dominar” as estatísticas de visitantes), na Ásia a situação é bem diferente. Os chineses dominam com larga vantagem (o que é compreensível face ao tamanho da China…) e nem sempre são visitantes pacíficos e respeitadores. Na Tailândia um turista chinês foi, recentemente, filmado a tocar em objectos sagrados num templo budista enquanto outro seu concidadão achou por bem fazer o “número 2” em plena rua (sim, “esse” número 2). Ah, e é impossível esquecer o turista (também ele chinês) que queria abrir a porta do avião em pleno voo porque…tinha calor e queria sair. E todos sabemos que quando isso acontece o melhor é mesmo tentar abrir a porta não é?

Calma! Como é óbvio nem todos os turistas chineses causam o caos por onde passam. Muito boa gente tem maneiras, e sabe respeitar a cultura que visita (e ainda bem que assim é). E sim, turistas mal comportados, e más pessoas, há em todo o mundo (incluindo em Portugal). Mas é precisamente para evitar casos semelhantes a estes que é necessário regular o turismo em Portugal.

Não fará sentido defender os habitantes da Mouraria e de Alfama, fazendo-os permanecer e travando a “invasão” de cidadãos do mundo? Não fará sentido tornar o Bairro Alto um local habitável para pessoas de idade e que apenas querem manter a sua rotina e descansar durante a noite? Não fará sentido tentar proteger o ambiente punindo quem suja o chão, a relva e todos os locais públicos em geral? Se calhar faz.

Muitas vezes não são necessárias medidas muito complexas, mas sim “vontade política”. Se existir vontade política em pegar neste assunto com a necessária atenção então tudo pode tornar-se simples. Aparecerá uma estratégia nacional para o sector do turismo, por exemplo.

Aparecerão medidas para atrair certo tipo de turistas afastando-se assim do método “todos ao molho e fé em Deus”, dando outro exemplo. Quanto à taxação do turismo. Sou a favor, mas também contra. Eu explico. É necessário taxar. Se tudo for de borla os turistas vão cá estar…mas não gastarão cá o seu dinheiro (ou, a gastar, será apenas no indispensável). Mas há taxar e…taxar. Há muitas formas de chegar ao mesmo destino. E para obter bons resultados o caminho tem de ser o certo, não o mais rápido. Temos de taxar mas não a torto e a direito, colocando tudo a preços exorbitantes. Esse tipo de medidas apenas vão conseguir afastar os visitantes para as outras cidades/países. Mas atenção que taxar também pode ser de forma indirecta (lembram-se da multa se não cumprir a lei nas “zonas silenciosas”?) e não só da forma mais óbvia.

Concluindo: existem muitas formas de reagir face à enchente de turistas que tomou Lisboa de “assalto”. Uma é deixar tudo andar, esperando um milagre. Outra é pensar a sério, e estudar, este tema encontrando soluções para conservar a magia lisboeta e para tornar o turismo sustentável e amigo do ambiente. Afinal de contas queremos turistas, mas não a qualquer preço. Senão daqui a uns anos quem abandona a capital não são os estrangeiros mas sim nós, os portugueses.

P.S: Não é preciso explicar que tudo o que foi referido acima necessita de um esforço conjunto e não apenas do empenho sector do turismo pois não? Ainda bem que não estimados leitores. Ainda bem que não.

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