Nas Notícias

Chuva de abril não tranquiliza ambientalistas, que dizem que não se poupa o suficiente

A seca regrediu em Portugal no mês de abril, mas ambientalistas ouvidos pela Lusa mantêm a incerteza sobre os meses mais quentes, frisando que, mais do que planos de contingência, Portugal tem de se concentrar na poupança.

O presidente da Zero, Francisco Ferreira, destacou que, apesar de terem melhorado, os valores desperdiçados em Portugal são “muito significativos” na agricultura, em que 40 por cento da água é desperdiçada, isto no setor que leva 75 a 80 por cento” da água utilizada em Portugal.

Segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Portugal continental registou em abril uma diminuição da área em seca meteorológica, com exceção das regiões a sul do rio Tejo, devido aos elevados valores de precipitação registados.

De acordo com índice meteorológico de seca (PDSI) disponível no ‘site’ do IPMA, a 30 de abril verificou-se uma diminuição da área em seca meteorológica e da sua intensidade, mantendo-se apenas as regiões a sul do rio Tejo em situação de seca.

No final do mês, 27,9 por cento de Portugal continental estava em seca moderada, 26,4 por cento em seca fraca, 23,7 por cento em normal, 18,3 por cento na classe de chuva fraca e 3,7 por cento em seca severa.

Francisco Ferreira põe o foco no “programa nacional para uso eficiente da água” aprovado em 2012 e em vigência até 2020, em que “está claro o que é preciso”, que é poupar e prevenir.

“As campanhas e planos de contingência são importantes, mas o trabalho com a sociedade civil, com as associações de regantes, com os académicos…honestamente não está a acontecer”, lamentou.

O ambientalista indicou que uma das medidas desse plano é monitorizar os consumos de água, reduzir “muito as fugas nas redes de distribuição” e distinguir “o tipo de rega e culturas que precisam menos de água”.

“Não estamos a monitorizar as medidas com melhor resultado e a fazer mudanças estruturais para pouparmos água em tempo de seca”, considerou.

“Isso permitir-nos-ia ser muito mais resilientes a lidar com a seca. Estamos a ter secas mais intensas e frequentes e problemas porque quando Portugal tem seca, Espanha também tem e os rios internacionais têm caudais mais reduzidos”, afirmou.

Uma das medidas anunciadas pelo Governo é a Estratégia Nacional para a Reutilização de Águas Residuais Tratadas, que segundo o Ministério do Ambiente, deverá estar terminada “até ao início do segundo semestre” e permitirá usar águas encaminhadas das ETAR para rega ou lavagem de ruas.

“Os Planos de Ação para as Entidades Gestoras com gestão das 52 maiores ETAR de Portugal continental estarão previsivelmente concluídos até ao final do ano de 2019”, acrescentou o Ministério.

Francisco Ferreira admite “imenso receio de que os resultados fiquem muito aquém”, com “exigências de tal forma grandes que não se consiga encaminhar as águas residuais tratadas.

O presidente da Quercus, João Branco, afirmou que o panorama até ao início de abril “estava muito complicado” e que, apesar de alguma regressão da seca, “se não chover mais significativamente até ao fim de setembro, torna-se problemático para a agricultura, para a floresta e para os incêndios”.

O ambientalista ressalvou que “no clima mediterrânico é irregular a distribuição da chuva”, mas que nas últimas duas a três décadas, repetem-se os anos secos e quentes.

Os efeitos das secas recorrentes já se fazem sentir em espécies como o sobreiro, azinheira ou castanheiro, as mais afetadas por “períodos prolongados” de falta de água.

As alternativas para chegar a água, como os furos, são “soluções fáceis” imediatas, mas “também se esgotam” os lençóis freáticos, pelo que não é possível continuar a furar durante muito tempo.

Para prevenir o verão as empresas de águas do Alentejo e do Vale do Tejo já começaram processos de contratação de autotanques para distribuição de água a populações afetadas, o que no ano passado aconteceu na zona barragem de Fagilde, no distrito de Viseu”, afirma o Ministério do Ambiente

Apesar de não se preverem para já “situações preocupantes” de abastecimento público, a Águas Públicas do Alentejo já começou a contratar autotanques para abastecimento de furos e a Águas do Vale do Tejo “já possui um procedimento interno de contratação para construção e instalação de furos e transporte por camiões cisterna”.

O docente de Engenharia do Ambiente Joanaz de Melo, do Gabinete de Estudos e Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA), salienta que a seca não é a única responsável pela escassez de água, indicando que a poluição e o desperdício trazem carência.

No meio urbano, “uma pessoa pede 1,5 a dois litros de água por dia, mas consome 270 litros” das fontes, referiu, indicando comportamentos próprios “de um estilo de vida sumptuário” praticados todos os dias, como “fazer sauna no banho”.

A nível estrutural, conseguiu-se a cobertura quase total de água potável para todos os habitantes, mas cerca de 20 por cento dos portugueses não tâm acesso a rede de tratamento de esgotos.

“A escala nacional de reutilização de água é muito baixa”, afirmou, referindo que é sintoma de uma mentalidade em que se acredita que vivemos num país rico, com água para desperdiçar”.

“Não temos gestão de água nenhuma”, considerou Joanaz de Melo, frisando que faz falta “monitorizar o que há e compatibilizar os usos da água” e que “não se começa a planear só quando para de chover”.

Camiões para distribuir água quando falta nas torneiras “é sintoma de mau planeamento prévio”.

“Não temos falta de água, temos é falta de juízo”, sintetiza Joanaz de Melo.

Em destaque

Subir