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Afinal existe solução para os Sem Abrigo!

Poucas imagens expressam de forma tão directa, e imediata, a decadência da actual sociedade como um sem-abrigo a pernoitar em frente a um prédio numa fria noite de inverno. Até aqui penso que todos estejamos de acordo. Mas, infelizmente, os sem-abrigo sempre foram encarados como um “mal impossível de combater”. Ou seja, no fundo todos estão do seu lado mas a verdade é que permanecerão eternamente nas ruas das vilas e cidades uma vez que nenhum partido político conseguirá recuperá-los completamente. Mas, e se eu lhe dissesse que está a decorrer um estudo que afirma ter uma possível solução para reduzir, drasticamente, o número de sem-abrigo nas ruas a nível mundial? Parece ficção científica, eu sei, mas é a mais pura das realidades.

Antes de apresentas as possíveis soluções é importante realçar que cada caso é um caso. Cada sem-abrigo tem uma história para contar, quase sempre com uma boa dose de contratempos, azares e más decisões. Serve esta nota prévia para admitir desde logo que as soluções apresentadas abaixo não tenham iguais doses de sucesso em todas as cidades ou países (até porque as diferenças culturais podem ter uma enorme influência, obviamente). Agora sim, vamos ao que interessa!

Está a decorrer nos Estados Unidos da América (EUA) o primeiro estudo de larga escala realizado acerca das possíveis soluções para ajudar os sem-abrigo e as respectivas famílias. Dá pelo nome de “The Family Option”, tem uma duração prevista de três anos, pretende avaliar o impacto e a taxa de sucesso (ou insucesso) de três alternativas para os sem-abrigo e as respectivas famílias e está a ser conduzido pelo Department of Housing and Urban Development (HUD). Antes de apresentarmos as alternativas é preciso também dar conta do facto do estudo se focar em doze comunidades de várias cidades norte-americanas (entre as quais estão Boston, Denver, Kansas City, Phoenix ou Honolulu apenas para citar algumas), envolvendo 2300 famílias. E embora o estudo apenas vá a meio já existem dados que sugerem uma redução do número de sem-abrigo nas ruas e um aumento do respectivo nível de vida (ainda que muito baixo, não deixa de ser um aumento).

O estudo está avaliar três alternativas diferentes. Para tal foram criados quatro grupos, tendo cada um acesso a uma solução diferente. O objectivo é testar as várias soluções e perceber qual a mais eficaz.

O primeiro grupo recebeu aquilo que a equipa chamou de “Housing Choice Voucher” (também conhecido como “Secção 8”), que lhes forneceu um subsídio e uma habitação permanente. O segundo grupo recebeu ajuda no aluguer temporário de habitação no mercado privado (uma opção também conhecida como “realojamento rápido”). O terceiro grupo recebeu habitação por tempo limitado num ambiente que incluía alguns serviços como assistência médica ou aconselhamento. Por sua vez o quarto grupo recebeu o tipo de intervenção normalmente dado a uma família sem-abrigo, nomeadamente algum tempo em abrigos de emergência e ajuda para que encontrem, por conta própria, uma habitação (temporária ou permanente).

Após 18 meses o estudo afirma que as famílias que utilizaram os vouchers estão a sair-se muito melhor do que aquelas que receberam intervenções tradicionais. Começando logo pelas crianças das famílias que receberam vouchers dado que estas passaram a trocar de escola com muito menos frequência do que as restantes. Estas famílias passaram também menos tempo em abrigos, os pais tiveram menos problemas de saúde, registaram-se menos casos de violência doméstica e eles mantiveram-se mentalmente mais estáveis do que aqueles que receberam intervenções ditas “normais”.

Querem mais conclusões? Vamos a elas. Cerca de um quarto das famílias desalojadas tinham passado pelo menos uma noite num abrigo no último mês contra apenas cerca de 10 por cento das famílias que utilizam vouchers. Cerca de 65 por cento das famílias sem-abrigo do quarto grupo sofreram de insegurança alimentar (ou seja alimentavam-se muito menos, e muito pior, do que o recomendado) contra apenas cerca de 10 por cento das famílias que recebem os ditos vouchers. E por fim cerca de 4,6 por cento dos integrantes do quarto grupo afirmaram não possuir boas condições de saúde contra menos do que 1 por cento das famílias com acesso aos já referidos vouchers.

Contudo também existem pontos negativos a respeito dos integrantes do primeiro grupo.

Essas famílias tornaram-se menos propensas a ter um emprego. Isto porque, dado que possuem uma habitação sentem menos necessidade de trabalhar. É ainda importante referir o facto de esta solução exigir que as famílias paguem de renda da habitação um terço do dinheiro que recebem. E o que é que isto significa? Basicamente embora a sua situação melhore não resolve todos os problemas dado que o dinheiro que sobra às referidas famílias é pouco.

E os custos? Estas medidas podem ter melhores resultados, mas será que gastam menos dinheiro que as existentes? Os vouchers podem parecer uma forma cara para tirar os sem-abrigo das ruas, mas, por enquanto, os custos não são muito diferentes dos programas que têm existido até agora. O custo médio mensal de proporcionar a uma família um abrigo de emergência é de 4.819 dólares por mês. O alojamento provisório custa cerca de 2706 dólares mensais enquanto um realojamento rápido custa 878 dólares e um subsídio permanente, ou voucher, custa cerca de 1.162 dólares. Contudo é importante referir que o subsídio permanente é o único onde estes custos se podem alargar por mais de um ou dois anos.

Mas um subsídio de habitação não é necessariamente para sempre. Estar numa habitação permanente pode permitir que as famílias se voltem a endireitar, encontrando trabalho, e perdendo gradualmente a necessidade dos subsídios. Muitas das vezes as famílias usufruem dos subsídios durante três ou quatro anos e, a partir daí, continuam a sua vida.

O estudo vai decorrer durante mais 18 meses, contudo estes dados ajudam a demonstrar a importância dos referidos vouchers. Na esmagadora maioria dos casos dar um tecto às famílias muda, mesmo, tudo. Claro que não resolve todos os problemas de uma vez, mas está a provar ser uma ajuda decisiva.

E as possíveis críticas estão a esbarrar nos custos. Afinal parece que não é assim tão caro “dar” uma casa a estas famílias. Afinal este tipo de medidas pode, mesmo, resultar. Afinal, as famílias conseguem mesmo recuperar, e reerguer-se, depois de uns anos de apoio. Basta que exista vontade política para tal.

Agora, é importante reter o facto de este estudo ainda estar apenas a meio (dado que os resultados finais podem não ser tão bons e optimistas quanto estes) e de a realidade ser a norte-americana e não a europeia. Mas porque não tentar, pelo menos, fazer um estudo semelhante na Europa?

Vamos esperar não só pelo final deste estudo como pelo crescimento da vontade política em pelo menos tentar diminuir o número de sem-abrigo. Todos temos cada vez menos, mas nunca nos devemos esquecer daqueles que nada têm. Todos somos importantes, mas estes têm de estar na linha da frente. Aconteça o que acontecer. Venha quem vier.

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