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Os esquecidos da sociedade

refugiados paradeiro desconhecidoMuito se falou nos últimos tempos sobre a questão dos refugiados. Bastante tinta correu com os prós e contras de acolher aqueles que fogem da guerra e procuram a sobrevivência. No entanto, neste texto não vos falarei de refugiados. Tanto se discutiu a sua vinda que pouco se discutiu a sua integração. Neste artigo vou falar-vos antes desta questão que considero fundamental para compreender e promover os fluxos migratórios: a integração social dos imigrantes.

Em Portugal, a integração social dos imigrantes foi uma questão que surgiu com uma dimensão nunca antes vista na década de 90. Nessa altura, o país recebeu um grande fluxo migratório dos países membros dos PALOP, do Brasil e dos países de Leste da Europa. Estas famílias procuravam uma vida melhor, sobretudo assente na miragem da explosão da construção civil portuguesa. Acima de tudo, procuravam o sonho europeu encarnado em Portugal. Na altura, a procura de mão-de-obra barata fez com que estes imigrantes tivessem emprego em pouco tempo. No entanto, esta ilusória receptividade foi abalada por uma mentalidade retrógrada que marginalizou alguns destes novos cidadãos. Apesar de a média dos imigrantes não ser muito instruída, verificou-se uma grande subvalorização daqueles que efectivamente tinham habilitações. Mas este não foi o único problema que eles enfrentaram.

Devemos então analisar esta questão complexa de um ponto de vista objectivo. É necessário compreender o fenómeno da segregação social dos imigrantes e apurar responsabilidades para corrigir falhas estruturais da política de imigração. A este propósito, vem-me à memória um pensamento sábio de Padre António Vieira no Sermão de Santo António aos Peixes, que do meu ponto de vista traduz bem este fenómeno:

“Ou o sal não salga, ou a terra não se deixa salgar”.

Aplicando este pensamento à matéria em questão: ou o Estado não integra, ou os imigrantes não se deixam integrar.

Começando pela primeira premissa, é fácil de ver que foram diversas as vezes em que o sal não salgou a terra. A mentalidade xenófoba teve uma dupla consequência negativa: primeiro, a falta de oportunidades de emprego que permita a mobilidade social leva à perpetuação das assimetrias e da exclusão social. A partir do momento em que determinados empregadores definem as suas escolhas em função da cor da pele, torna-se muito difícil a um imigrante procurar um emprego que o ajude a melhorar as condições de vida. O outro fator preponderante para a mobilidade social é a educação. Mais uma vez aqui existe uma falha grave no sistema. O racismo vivido nas escolas leva a um mau ambiente gerado em torno das minorias étnicas, que não têm condições para ter sucesso escolar.

Assim, as duas vertentes da mobilidade social, isto é, o trabalho e a educação, são hipotecadas pelo racismo e xenofobia que cortam as pernas a qualquer ambição de progressão na vida. Vendo à sua frente uma sociedade fechada, estas minorias também se fecham sobre si próprias, procurando aceitação e compreensão junto dos seus.  Sendo rejeitados pela sociedade e aceites nas suas comunidades, geram-se ghettos. A densificação dos subúrbios como zonas residenciais pobres leva à criação de clausuras sociais nas quais a criminalidade surge como um fenómeno natural. A imagem do Estado aos olhos dos cidadãos imigrantes prende-se sobretudo com a figura policial, que muitas vezes adopta posturas excessivamente hostis para com estes seres humanos que merecem respeito pela sua cidadania e dignidade.

Quando o Estado não salga a terra, ou seja, quando não promove um verdadeiro processo de integração social dos imigrantes, é muito difícil que eles se sintam bem na sociedade portuguesa. O único caminho para a subida social para estes filhos da imigração continua a residir sobretudo no talento natural, onde alguns conseguem destacar-se nas artes e no desporto, ainda que tenham de ultrapassar inúmeras dificuldades.

Por outro lado, a verdade é que por vezes a terra não quer ser salgada, isto é, alguns imigrantes não se deixam integrar por vezes. Por exemplo, a sobrevivência à custa do rendimento de reinserção social ajuda a construir uma imagem injusta de preguiça e procura de facilitismo que se generaliza a todas as comunidades de imigrantes. Quando alguns preferem viver com o rendimento de reinserção e não trabalhar, estão lançadas as bases para uma demonização dos imigrantes, desrespeitando o suor daqueles hercúleos trabalhadores suburbanos que se levantam às cinco da manhã para irem trabalhar e retornam a casa às 23h.

Infelizmente, esta é uma questão que teima por não ser introduzida na agenda política da maioria dos partidos políticos, de esquerda e de direita. É importante que a direita portuguesa mostre que se preocupa com esta franja da sociedade. Olhando para o actual contexto demográfico, estas minorias em breve tornar-se-ão parte considerável da sociedade, devido à grande natalidade que normalmente as caracteriza.

É fundamental trazer estas comunidades para a democracia e passar a mensagem de que há esperança, de que não têm de morrer na mesma condição em que nasceram.

É aí que deve entrar o papel dos partidos políticos. Mais do que olhar para estas comunidades como hipotético eleitorado, eles devem olhar para elas como cidadãos que a sociedade deve abraçar.

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